"Viver é enfrentar um problema atrás do outro. O modo como você o encara é que faz a diferença." (Benjamin Franklin)
Dependência química: a
escravidão dos desejos
"Viver
é enfrentar um problema atrás do outro. O modo como você o encara é que faz a
diferença." (Benjamin Franklin)
Atualmente
o aumento do uso de drogas por parte de crianças e adolescentes cada vez mais
jovens tem gerado muita preocupação, não só entre os profissionais de saúde,
como também entre os familiares que vêem não só a destruição da vida dos
dependentes, que muitas vezes passam a roubar, matar a até mesmo cometer o suicídio,
como também a destruição de toda a família.
Para que haja a recuperação e ressocialização desses indivíduos é necessário e
fundamental a participação da família.
Primeiramente
é preciso entender que dependência química , é uma doença que precisa ser
compreendida e tratada como tal. Ser dependente não é falta de caráter, e sim
uma doença que necessita de tratamento.
É na
família que devemos encontrar o cerne para as ações preventivas e para as
intervenções em relação ao uso das drogas.
Infelizmente o uso e abuso das drogas é cada vez maior, gerando sérias
consequências não só para a família, como também para o adolescente. É
necessário que a família busque informar-se sobre a dependência para que possa
agir junto a seus filhos não só na prevenção, como também na intervenção quando
a dependência já se encontra instalada.
É necessário entender o que é dependência química, os fatores que predispõem ao
uso de drogas, como prevenir e como lidar com o problema.
O mais importante é derrubar o preconceito que infelizmente ainda existe por
parte de pessoas mal informadas.
Um
pouco de história
Há
séculos atrás os bêbados no reino unido eram colocados em praça pública, tinham
seus nomes publicados nos jornais e eram execrados, tudo isso como forma de
punição por sua dependência.Nesta época, a dependência era encarada como um
desvio de caráter, achava-se que a pessoa tinha falta de vergonha ou falta de
caráter e por isso não conseguia parar.
No século XX, após vários estudos científicos, houve uma mudança de foco, e o
consumo de substâncias psicoativas, passou então a ser visto como doença, e não
mais como falta de caráter. Infelizmente algumas pessoas ainda pensam como nos
séculos passados e todo este estigma só aumenta a desinformação e dificulta o
tratamento.
Então qual a definição de dependência química?
Segundo a
Organização Mundial da Saúde, "droga é toda a substância que, introduzida
em um organismo vivo, pode modificar uma ou mais de suas funções".
A
dependência é uma doença, por doença podemos entender a perda total ou parcial
da capacidade de escolha em algum aspecto humano. Neste sentido podemos dizer
que o dependente é escravo dos seus desejos, porém ele pode e deve ser
responsável pelo seu tratamento e recuperação. Ele se torna escravo da droga, e
passa a pensar que não é possível viver sem ela, mas é preciso encarar a doença
e lutar contra ela.
“O
dependente químico é escravo dos desejos e não dono de suas vontades”
Síndrome
de dependência é o
conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se
desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente
associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o
consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma
maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e
obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de
abstinência física. (CID 10)
A
sociedade Americana de Medicina de Adicção define dependência química como uma
doença crônica, primária, cujo desenvolvimento e manifestação são influenciados
por fatores genéticos, psicossociais e ambientais a doença é frequentemente
progressiva, caracteriza-se por uma contínua e periódica perda de controle,
pela obsessão ou uso de substância psicoativa e distorções na maneira de
pensar, principalmente a negação.
A
dependência ao contrário do que algumas pessoas pensam não é causada só pelas
drogas ilícitas, as lícitas (calmantes , cigarro e álcool) também podem causar
dependência.
Podemos
dizer que a dependência química é causada pela perda do controle do uso de
substâncias psicoativas. Essas substâncias atuam no sistema nervoso central
provocando os sintomas psíquicos e estimulando o uso contínuo da mesma.
E o que
complica ainda mais o quadro é a tolerância que o organismo desenvolve, isto é,
é necessário utilizar cada vez mais substâncias psicoativas para se obter o
mesmo efeito.
Diferença
entre dependente e usuário
Pode-se
definir o primeiro como sendo aquele que usa frequentemente determinada droga
que causa a necessidade física ou psíquica de utilizar cada vez mais para
sentir o mesmo efeito, levando-o à tolerância. O segundo, sem grau de
vinculação física ou psíquica, utiliza eventualmente droga para buscar
imaginária euforia.
Principais
sinais e sintomas da dependência química:
-
Tolerância: É a necessidade que o indivíduo experimenta de aumentar cada vez
mais a quantidade de drogas para obter o mesmo efeito.
- Crises
de abstinência: ocorre quando o uso é suspenso, ocorrendo então sintomas como:
tremor, ansiedade, irritabilidade e insônia.
- Desejo
persistente ou tentativa fracassada de diminuir o uso.
- O
dependente passa a perder boa parte do seu tempo na busca e no consumo das
substâncias.
-
Preferência das drogas às atividades que antes praticava
- Apesar
dos malefícios físicos e psicológicos decorrentes do uso das drogas , o
indivíduo persiste no uso.
- Auto
destrutividade
-necessidade
de prazer imediato, vida sem objetivos
-
Tendência à comportamentos agressivos e envolvimento com situações de risco.
-Negação
da patologia
- Em
alguns casos quebra de vínculos afetivos e relacionamentos interpessoais.
Com o
aumento do uso de drogas pelos adolescentes têm surgido pesquisas neste campo
com a finalidade de avaliar os fatores de risco, ou seja aqueles fatores que
podem predispor o adolescente a usar drogas e os fatores de proteção, aqueles
que inibem o risco de usar drogas.
Pesquisas
têm apontado como fatores de risco:
1)
cultural e social: permissividade social, disponibilidade de droga, extrema
privação econômica
2)
interpessoal: a) na infância – família com conduta alcoólica e droga relacionadas,
pobre e inconsistente manejo familiar, personalidade dos pais e abuso físico
b)
na adolescência – conflitos familiares e ou sexual, eventos estressantes
(como mudança de casa e escola), rejeição dos seus pares na escola ou outros
contextos, associação com amigos usuários.
3)
Psicocomportamental: precoce e persistente problema de conduta, fracasso
escolar, vínculo frágil com a escola, comprometimento ocupacional,
personalidade anti -social, psicopatologia (Transtorno de Déficit de Atenção e
Hiperatividade, depressão e transtorno de conduta, ou ansiedade nas mulheres),
atitudes favoráveis para drogas, inabilidade de esperar gratificação
4)
Biogenético: genealogia positiva para dependência química e vulnerabilidade
psicofisiológica ao efeito de drogas. (Simkin)
Pesquisas
têm apontado como fatores de proteção:
Ambiente
estável, alto grau de motivação, forte vínculo pais-criança, supervisão
parental e disciplinas consistentes, ligação com instituições pró-sociais e
associação com amigos não usuários. Brown enfatiza que o exercício de
colocação de limites por parte dos pais, o monitoramento familiar e ter uma
refeição diária junto com os filhos funciona também como fator de proteção.
É
importante salientar que muitos dos adolescentes que iniciam o uso de drogas
têm problemas relacionados à auto-estima e socialização, geralmente relatam que
ao usar drogas se sentem mais livres, mais “soltos”. Por isso é importante que
a família preste atenção nos primeiros sinais de mudança no comportamento.
E quando
o adolescente já se encontra dependente , como a família pode ajudar?
É
necessário que todos estejam informados sobre a vida do adolescente, entender e
aceitar que a dependência é uma doença pra que possa resgatar o adolescente e
restabelecer a harmonia familiar.
No livro
“Drogas -a busca de respostas”, os autores fazem a seguinte constatação:
“Parece verdade incontestável que os pais são os últimos a saber, mas será isso
uma verdade impossível de ser modificada?”
Acredito
que todos os pais deveriam fazer esse questionamento, pois é necessário que
eles estejam cada vez mais próximos aos seus filhos, que conheçam cada vez mais
a respeito deles, para que possam reconhecer os primeiros sinais de perigo.
Também é
necessário que a família não se iluda achando que somente uma boa estrutura
familiar será capaz de afastar os filhos das drogas, é claro que ajuda, mas o
problema da drogadição envolve muitos outros fatores em sua causa. Vários
fatores podem predispor uma pessoa ao uso de drogas, tais como personalidade,
influência de amigos, facilidade para obter drogas entre outros...
Portanto
não adianta fechar os olhos, o mais importante é aprender a compreender os
primeiros sinais, para que seu filho não tome o caminho da dependência.
Exemplos
de alguns sinais que podem indicar o uso:
-Mudanças
bruscas de humor quando não for o normal
-Mudanças
súbitas de hábitos
-Crises
infundadas de agressividade (cocaína e crak) ou crises de passividade (maconha)
-Mudanças
no hábito de alimentação aumento de apetite associado ao uso de maconha, e
diminuição associado ao uso de crak e cocaína
-
Mudanças de hábito no sono, aumento associado à maconha e diminuição associada
ao uso de crak ou cocaína
-Perda e/ou
ganho de peso no uso de crak a perda é muito rápida
-Queda
brusca no rendimento escolar ou no trabalho
-inquietação
constante
-Fuga do
contato visual, pessoal ou proximidade
-Negar ou
dificultar o contato da família com colegas de trabalho ou escola
- Recusa
conversar sobre o assunto ou demonstra intranquilidade ao conversar
-Desleixo
pessoal
-interesse
exagerado por muitas atividades ao mesmo tempo
-Dispersão,
euforia ou depressão sem que haja uma causa aparente associada
-Mudanças
de amigos e de grupos de referência
-
Amizades secretas
-Isolamento
-Estado
de letargia e depressão (maconha ou depressão pós uso de cocaína)
-Relato
de sensação de dormência nas pernas, braços e região da cabaça pode ser um
indício de overdose.
Esses são
apenas sinais que podem denotar o uso de substâncias psicoativas.
Normalmente a primeira reação da família , é a negação, isto é não aceitar que
seu familiar está usando drogas, esse tipo de atitude de não encarar o problema
só faz com que a situação se agrave ainda mais.
Então a primeira coisa que deve ser feita é encarar a doença de frente e
procurar profissionais capacitados para que possa orientá-los.
É necessário que a família tome uma atitude imediata, porém sem ansiedade, sem
projetar o problema para o futuro, dependência é uma doença crônica, deve se
vivido um dia de cada vez, para que se possa então controlar a situação.
É necessário também que os pais sejam coerentes em suas atitudes, que estejam
de acordo, para que se evite a manipulação por parte do filho.
E é claro deve-se sempre manter o diálogo, é preciso que os pais ajudem os seus
filhos a enxergarem a saída de tal situação, a ver a luz no fim do túnel, já
que muitas vezes a droga não permite que eles tomem essa consciência sozinhos.
Existem pesquisas que comprovam que o bom relacionamento com a família também
desempenha um papel importante na prevenção de recaídas.
É
importante deixar bem claro que apesar da dependência ser uma doença, é
necessário que o dependente tenha total responsabilidade pelos seus atos, a
família não pode proteger em demasia, ele precisa tomar consciência e assumir
também a responsabilidade pelo seu tratamento. Apoiar definitivamente não
significa paternalizar a relação, não se deve de forma alguma
reforçar o comportamento inadequado.
É preciso ter consciência de que a doença tem plena capacidade de controle.
Devido ao estresse e a destruição que a dependência causa não só no doente, mas
em toda a família, muitas vezes se torna necessário que esta também busque
ajuda profissional.
Infelizmente muitas vezes a vergonha, a culpa e o preconceito impedem não só o
doente como a família de buscar ajuda. A recuperação é possível, desde que se
dê o primeiro passo.